sábado, 26 de julho de 2008

Cheiro de Lençol. Ou Sinestesia - Parte Um.

Cheiros me envolveram e encantaram-me em todas as lembranças da minha vida. Não há memória sem um cheiro específico, independente do que se trate o cheiro. Macarronada da tarde de fantasia, aquele perfume específico da escada para o msn, shampoo Palmolive neutro, pouco importa, tudo serve. Cada cheiro abre a gaveta específica da memória correspondente, num ritual quase mágico. Cada pessoa seu cheiro. Cada lugar seu cheiro. Cada data seu cheiro. Cada música seu cheiro. Correspondência aleatória. A probabilidade de uma festa com docinhos cheirar a docinhos é a mesma de uma festa com docinhos cheirar a papel sulfite. Porém, mesmo com o instinto olfativo da minha vida, só depois de quase uma década conclui o que nos envolve com as pessoas. O Cheiro do Lençol. Cada lençol guarda em forma de cheiro uma personalidade. Poeira, doce, silêncio, alvejante Pompom, sexo, naftalina, alegria, dinheiro, desespero se misturam, desrespeitando qualquer ordem, criando uma ordem secreta que invoca o não esquecimento. Não é difícil perceber que estamos mais próximos de quem conhecemos a cama. Difícil é o resguardo e a seleção das camas que conheceremos. Aconselho a boa escolha e a reserva. As camas e os respectivos lençóis que já conhecemos nos aprisionaram para sempre. Escolher a partir de então, significa a escolha da prisão. Todo lençol tem sua própria história, e nehuma história é desperdício. Portanto, não aconselho pudor, restrição, resistência. Antes um arrependimento que uma saudade vazia.
E tenho dito.